segunda-feira, 31 de agosto de 2009









Negócio de menino


Rubem Braga


Tem dez anos, é filho de um amigo, e nos encontramos na praia:

- Papai me disse que o senhor tem muito passarinho...

- Só tenho três.

- Tem coleira?

- Tenho um coleirinha.

- Virado?

- Virado.

- Muito velho?

- Virado há um ano.

- Canta?

- Uma beleza.

- Manso?

- Canta no dedo.

- O senhor vende?

- Vendo.

- Quanto?

- Dez contos.

Pausa. Depois volta:

- Só tem coleira?

- Tenho um melro e um curió.

- É melro mesmo ou é vira?

- É quase do tamanho de uma graúna.

- Deixa coçar a cabeça?

- Claro. Come na mão...

- E o curió?

- É muito bom curió.

- Por quanto o senhor vende?

- Dez contos.

Pausa.

- Deixa mais barato. . .

- Para você, seis contos.

- Com a gaiola?

- Sem a gaiola.

Pausa.

- E o melro?

- O melro eu não vendo.

- Como se chama?

- Brigitte.

- Uai, é fêmea?

- Não. Foi a empregada que botou o nome. Quando ela fala com ele, ele se arrepia todo, fica todo despenteado, então ela diz que é Brigitte.

Pausa.

- O coleira o senhor também deixa por seis contos?

- Deixo por oito contos.

- Com a gaiola?

- Sem a gaiola.

Longa pausa. Hesitação. A irmãzinha o chama de dentro d'água. E, antes de sair correndo, propõe, sem me encarar:

- O senhor não me dá um passarinho de presente, não?